Maresia na Costa

24 novembro 2006

O carangueijo pilado, história e iscagem


O meu amigo António Simões da EFSA Portugal, não pára, é uma autentica enciclopédia de estudos e de vivências que adora partilhar com os amantes da pesca, aqui vai um dos seus textos cheios de saber:

Considero este caranguejo, também chamado por patela, escasso ou mexoalho, o melhor isco de todos e porquê?

Desde tempos imemoriais, princípios do Século XIV, que a apanha deste caranguejo ao longo da costa Portuguesa entre a Nazaré e a foz do Rio Minho, mobilizou e alimentou populações na sua apanha e venda para fertilizantes orgânicos da terra. Comunidades piscatórias actuais foram fundadas, como a Apúlia, pela apanha de pilado, porque em dias de nortada rija, os pescadores da Afurada e Espinho, abeiravam a terra e aí permaneciam em palhotas até que o mar e vento acalmassem.

A campanha começava no inicio do Verão e terminava no Outono.

O mar tingia-se dum amarelo acastanhado, as barcaças leiloavam na areia este frescum e pão do mar aos agricultores da região.

Com a entrada do meio do Século XX, do Nitrato do Chile, o primeiro adubo, industrializado, esta arte entrou em decadência até aos nossos dias.

Vitimas do excesso da apanha talvez, as nuvens de pilado hoje em dia são dispersas, o robalo e sargos perseguem-nos, estão aos milhares por vezes fixos nas laminarias (n/alga castanha) agarrados aos fundos e são um petisco, um manjar inesgotável, para o peixe. Está-lhes nos genes, o seu odor ao peixe é inconfundível, é uma das bases da sua alimentação.

O pilado, suas características: É um caranguejo que tem a capacidade de "voar" na água, devido ao último par de patas ter uma forma achatada, plana e arredondada no final.

Os robalos engordam no Verão com tamanha abundância de comida disponível suspensa na água ali mesmo à feição de abocanhar.

A sua vinda à costa no Verão tem dois motivos, o seu acasalamento, numa média de 60 % de machos e 40 % de fêmeas, é o alimento sustentado nos cardumes de sardinha aprisionadas nas redes de cerco, e de suspensão.

Aparece todo o ano, mas em quantidade e melhor qualidade para iscar é agora nos meses de Setembro, Outubro e Novembro, e porquê?

Como iscar e escolher o pilado: É o melhor isco de todos mas… por ser difícil a sua conservação fresco e vivo, só quem vive à beira-mar ou se dirija a casas especializadas na venda do mesmo é que consegue arranjar.

Morto o caranguejo, o seu recheio depressa fica negro, putrefacto, não serve para nada.

Escolher o pilado para Casting, ao tento, à chumbeirinha, à bóia ligeira: para fazer a chucha do pilado ou iscar o seu recheio directo só se escolhem as fêmeas. Estão ovadas cheinhas de ova amarela no seu casco, os machos não têm nada, só cartilagem e água.

Como fazer a sua iscada: Apanhando as fêmeas vivas, cortar-lhes logo as pinças, são terrivelmente dolorosas e sangrentas e dada a sua agilidade, não é difícil apanhar-nos distraídos...

Com uma tesoura de cortar peixe, apara-se o rebordo da carapaça. Seguidamente, com uma faca fina e muito afiada, levanta-se a mesma e rapa-se todo o seu recheio.

Para iscar lanços mais afastados devem fazer a tradicional chucha com meia de senhora, iscar com um anzol fino na borda da dobra onde cortaram a meia tendo o cuidado de não perfurarem a dita cuja com o bico do anzol.

Para lanços mais de perto, suaves, devem iscar directamente, pondo um bom bocado por cima do anzol e com linha elástica muito fina apertar um nadinha. Se andar peixe, é tiro e queda, a própria lavagem e o odor libertado pela ova, o peixe come em milésimas de segundo. Neste sistema directo mais de dois minutos na água é tempo a mais, o mar já lavou o miolo. Com a chucha, se não romper a meia no lanço, o miolo leva mais tempo a lavar, podem ficar uns minutos com a iscada dentro de água.

Neste sistema podem ir engodando com as carapaças o pesqueiro, e se levarem em excesso, podem-no triturar para engodagem.

Para pescarem à bóia com pilado vivo ao robalo, é indiferente se são fêmeas ou machos, apenas importa que se mexam no anzol, (devem mantê-los vivos no oxigenador). O anzol deve ser do tipo Aberdeenn, fino, para não matar o caranguejo e deve deixá-lo mover-se facilmente. Deve ser iscado pela carapaça de lado na ponta junto ao terceiro, quarto par de patas.

Caso pensem em fazer chuchas do mesmo para as guardarem no congelador para outros dias de pesca, não sou muito adepto disso, a chucha fica negra. Sou adepto do fresco apanhado, comprado na hora, guardado no frigorífico, com um pano húmido de água salgada, por cima e pescar durante a noite do mesmo dia.

Boas pescarias!

20 novembro 2006

Pescadores de robalos

(Clique na foto para ampliar)

Adorei o post do meu amigo FC, daí o plágio...

Segundo poema do pescador

Pescando robalos no meio do canal
a lua de quarto deslocando-se lentamente
as areias cintilantes e as estrelas
cadentes que brilham de seu próprio apagamento
respiro o iodo o sal o vento
o cheiro a salsugem e penso que tudo não é senão o que já não é
e que o momento em que isto digo
é já outro momento

Por isso quando vou à pesca eu não vou só à pesca
procuro o peixe e o sentido ou talvez a ausência dele
toda a minha atenção se fixa e se concentra
há um robalo que não há e que só eu pressinto
não é ciência nem técnica é algo mais
de pé no meio do canal
lançando e recolhendo a linha
como quem escreve sobre as águas
a mesma pergunta interminavelmente
enquanto caem estrelas e as palavras
como elas fulguram em seu arder.

Manuel Alegre, in Senhora das Tempestades