Enquanto a época não recomeça vou deixando por aqui uns post's...
A Costa Vicentina é talvez ainda um dos últimos paraísos para a pesca em Portugal. Só de se ouvir este nome associamo-lo imediatamente aos fabulosos pesqueiros de Sagres e da Carrapateira, trazendo-nos à memória as histórias de grandes pescarias de sargos e robalos de grande porte. Infelizmente também nos lembramos logo das histórias de acidentes sofridos por pescadores, quase sempre, fatais.
De facto, ambas as lembranças são reais, é um local onde ainda se fazem grandes pescarias (embora cada vez menos) e também é verdade que todos os anos aquelas falésias roubam a vida a cerca de uma dezena de pescadores lúdicos.
No entanto, esse facto parece não incomodar a maioria dos que aqui se dedicam à pesca, vindos de outras zonas do Algarve e até, de outras áreas do País. Espalhados pelas falésias, inúmeros pescadores prosseguem a sua actividade indiferentes aos riscos que aí espreitam.
A altura das falésias, a profundidade do mar e a força do vento fazem com que nos sintamos bem pequeninos, face à força dos elementos. É aqui, que a terra acaba e o mar começa.
O material
Como já perceberam pelo que acima foi dito o local não é para brincadeiras por isso, toca a arranjar material a condizer, pois não vamos pescar em molhes ou pontões a 2 metros da água.
A cana – Telescópica, com pelo menos 5 m de comprimento e acção superior a 100 grs.;
O carreto – Forte, que levante sem problema um peixe de 1,2 kg a 50 m de altura, deve ter capacidade na bobine para, pelo menos, 250 m de monofilamento de 0,40 mm. Grande parte dos carretos que por aqui se vêm são feitos artesanalmente tentando imitar o mítico carreto Rocha (O carreto Rocha era fabricado por um operário da Lisnave, pesava quase 1 kg mas levantava peixes de 3 kg sem problemas e..., nunca avariava).
As bóias – De correr – A mais habitual é o clássico pião em tamanho XXL, que suporte chumbada furada de 50 a 80 grs., claro que em pesqueiros mais baixos, menos de 30 m, reduz-se o tamanho do pião de forma a que fique calibrado com chumbada furada de 20 a 40 grs., por cima da bóia leva uma pequena missanga que não lhe permite ultrapassar o nó de travamento.
Fixa – Bóias torneadas ou talhadas em madeira de diversos tamanhos, estas não necessitam de ser calibradas, trabalham deitadas. Também se pode utilizar o clássico pião, neste caso, este é apenas calibrado na madre com a chumbada e fixo sem folga com o nó de travamento/batente a impedir que a bóia corra.
A montagem – Por aqui ninguém pesca directo, utiliza-se sempre estralho para a montagem ficando a bóia e chumbada (se usarmos a bóia de pião) fixas na madre. A madre normalmente é em monofilamento 0,40 ou 0,45 mm, sendo o estralho, no mínimo do comprimento da cana, normalmente em monofilamento 0,25 ou 0,22 mm de boa qualidade. Não se usam chumbos fendidos no estralho, apenas uma chumbadinha de correr tipo olivette de 3 a 5 ou mesmo 8 grs para ajudar a afundar a iscada rapidamente.
No caso de bóias de correr o estralho tem os já citados 5 m, no entanto, consoante a profundidade dos pesqueiros, chega-se a pescar a profundidades de 15/20 m, vejam onde é que está o nó de travamento/batente…
No caso das bóias fixas, as que eu prefiro, o tamanho do estralho varia entre os 5 e os 10 m. Estas bóias têm um trabalhar muito mais natural e muito maior sensibilidade ao “toque” pois vê-se o afundar/empinar muito mais facilmente, mesmo com vento. Uma bóia de correr com um pouco de vento forma um “seio” de seda na madre e ao tentarmos esticá-la, para ter pouca folga, “obrigamos” a que a bóia se afaste do nó de travamento/batente o que a torna muito menos sensível aos “toques”.
Um dos espectáculos mais bonitos que se pode apreciar consiste em assistir à retirada de um bom exemplar, com mais de 1 kg, com bóia fixa e estralho de 8/10 m. A cana toda vergada e o peixe pendurado a kms da borda da falésia, inicia-se então a “dança” para a retirada do peixe que consiste em balanceá-lo para a esquerda, depois para a direita até que este movimento pendular permita a “chicotada” final que obriga o peixe a ultrapassar a falésia. Como depreenderão trata-se de uma técnica cujo domínio não é fácil e que nos custa alguns peixes até que a dominemos por completo.
Os iscos – Os iscos de eleição para a pesca à bóia reduzem-se apenas a 3, mas estes são quase obrigatórios: A sardinha para engodar e iscar com o filete do rabo ou o lombo, a gamba/camarão da costa fresca ou congelada e o célebre ralo, este último é realmente o tira-teimas com águas mais claras.
Os apetrechos – Porque a zona não é para brincadeiras, convém que nos equipemos a condizer, roupa confortável e folgada de forma a permitir liberdade de movimentos, calçado (muito importante) que “agarre” facilmente a rocha, nada de sapatilhas, botas de campino com sola macia, daquelas do mercado.
Para que tenhamos ampla liberdade de movimentos, já que muitas descidas são “manhosas” usa-se o kit “mãos livres”. O ceirão da Vicentina que se coloca às costas tipo mochila e que leva todo o material de que necessitamos, a mochila com o material de pesca, o isco, o pisador/migador de engodo, a cana já com o carreto montado (para não deslizar para um ou outro lado) e o balde com o engodo. Na parte posterior do ceirão coloca-se o cesto/rabeca que se prende com um mosquetão ou corda.
Os pesqueiros – Aqui é que a porca torce o rabo como se diria em gíria popular, vamos ter que distinguir 3 tipos de pescadores:
1. Os que vão à pesca passar um bocado bem passado em contacto com a natureza mas que não descuram o seu conforto e procuram pesqueiros acessíveis e abrigados;
2. Os que querem apanhar peixe não se importando com as condições climatéricas adversas nem com o seu conforto pessoal, apenas procurando arranjar um pesqueiro que dê peixe, mas nunca ultrapassando os limites do razoável pois não há peixe que valha uma vida.
3. Temos ainda o 3.º tipo de pescadores, os “loucos” das falésias, que munidos de cordas e carregados com todo o equipamento desafiam as falésias e pescam em locais onde mal cabe um balde e onde o mínimo descuido pode ser desastroso.
Enfim, o texto já vai longo e aqui o pescador, tipo 2, já tem saudades do Outono, que é quando a época recomeça...
Espero ter contribuído para que percebam um pouco melhor o que é a pesca por estas agrestes paragens.
Posted by ajs_ferreira_1961 at julho 30, 2005 07:14 PM
Boas Ferreira! entao e o da foto? é tipo 2 ou 3? o tipo descuida-se vai logo de carola e ainda falam da malta daqui de Sintra que abusa da sorte.....
O tal abraço.
ps é pa tenho que um dia ir ai exprimentar o teu quintal!!
Viva Amigo Ferreira,
Ao ler o seu texto até senti o cheiro desse paraiso que é a costa vicentina.
Amanhã lá estarei pra uma férias com maior do tempo dedicado à pesca pelas zonas de Monte Clérigo. Se quiser combinar uma pescaria deixo aqui o meu contacto ( 936048491 ).
Um abraço
Viva,
Felipão, aquele era pescador tipo 3, mas não lhe servíu de nada para além de disfrutar de uma vista priviligeada para ver os 3 "cabeçudos" que pus em cima de água... eh eh eh (infelizmente só consegui retirar o mais pequeno de 2,2 Kg).
Uma boa altura para visitares o "quintal" é por alturas do Carnaval ou da Páscoa, pensa nisso...
Abraço,
Caro Fernando,
Também vou entrar de férias pelo que a família exige o seu quinhão e, isto em Agosto é "fogo", mas nunca se sabe... se for para a zona apito.
Abraço,
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